sexta-feira, 27 de maio de 2011

Nada é como vai ser dantes, ou de como a política devia ser uma coisa de crianças

i.

eu não me consigo sentar sobre os calcanhares. não consigo, pronto. dobro os joelhos até certo ponto, sim, mas o melhor que consigo é ficar com o ar de quem arreia o calhau atrás de umas moitas. lá se foi a elasticidade. e foi-se a troco de quê?

ii.

a elasticidade física ainda é como o outro. se sentirmos muito a sua falta, diz-se adeus à auto-imagem viril e faz-se a inscrição no ioga. a elasticidade mental, essa, já é outra história. a sua ausência dá umas cãibras fodidas.

iii.
lembra-me como se fosse hoje. eu, o carlos, a cláudia, o rui e a kikas podíamos estar animadamente a brincar aos Cinco (cabia-me o papel de tim, o cão, por ser o mais novo...) e, de repente, alguém dizia ‘vamos antes brincar às escondidas’. e íamos. fretava-se uma aviãozinho militar para decidir quem ficava a contar e, em menos de um fósforo (cabia-me o papel de não brincar com eles...), mudava-se o jogo. assim, como quem estala os dedos porque nasceu com eles e não é entrevadinho.

iv.
mudava-se o jogo porque sim. e, a tomar conta de nós, estava o télé, manuel qualquer coisa, respeitável geronte que teria os seus 90 anos quando eu nasci. dedos e unhas amarelos do tabaco, que nunca largou, e uma cadeira de metal entre a porta, que também parecia nunca largar. ao contrário dos outros adultos que pareciam levar tudo a sério, o télé tinha qualquer coisa de beatífico. se nos distraíamos a encher panelas com água, terra e ervas que depois lhe atirávamos, a sua ira momentânea era uma coisa ligeira, meia dúzia de palavras ríspidas que mal percebíamos e uma certa impassabilidade – quase conivência – como quem sabe que nada é como vai ser dantes.

v.
mudava-se o jogo porque não. porque não valia a pena acreditar que o outro jogo é que era bom. porque, se fosse jogo de haver quem perdesse ou ganhasse, nada em disputa valia a perda de não experimentar outro jogo. e, assim como assim, tudo acabaria nas vozes das mães a lembrar-nos que era hora de papo-secos com manteiga e leite com toddy.

vi.
era isso que nós queríamos. brincar, tanto fazia se a isto se a outra coisa; brincar até que nos apetecesse o papo-seco – uma oposição dialética e às vezes de proto-guerrilha entre o apetite pelo papo-seco e o dever do papo-seco. brincar, brincar a não brincar, brincar a decidir a que é que se brinca, brincar à experimentação pura de qualquer ideia que parecesse valer a pena.

vii.

eu não me consigo sentar sobre os calcanhares. será, porventura, saudável. a falta de flexibilidade torna-me incapaz de me auto-felar, o que me leva a aceitar viver em sociedade e a participar activamente na bolsa de valores da companhia. não sei ao certo quando é que comecei a brincar ao jogo do ‘a sério’ com outros adultos – sei que ainda estamos na mesma, pouca gente parece achar piada à cena e ninguém parece querer brincar a outra coisa.

viii.

a elasticidade mental, pobrezinha, está de há muito calcinada por se brincar sempre ao mesmo. primeiro sintoma: o de sentir uma pergunta como “o que é que tu queres?” como uma espécie de ultimato. fugimos todos dela como fugíamos da maria, filha do télé, muito menos impávida que o pai e perita no manejo de vergastas diversas.

ix.

e o que é que queremos? que ‘tenhamos muita saúde e amigos também’, como nos parabéns? o que é que queremos para nós e para os outros, em especial para os que, por conveniência de linguagem, chamamos nossos? pois é. não sabemos. não sabemos nem queremos pensar muito nisso. segue jogo; segue jogo que este, ao menos, já sabemos como é que se joga.

x.

nada é tão elementarmente conservador como uma mãe que tem comida para dar aos filhos. mais: a injustiça constitutiva do jogo actual nem sequer melindra muito porque quase qualquer mãe acredita, mesmo que o negue, que os seus filhos são melhores que os outros. repiso: uma mãe que TENHA comida para dar aos filhos. a mãe que não tem, essa, pode estar disposta a parir uma revolução.

xi.

nada é tão elementarmente conservador como o homem que consegue providenciar. é evidente, não carece de outra explicação. o que não consegue, mais depressa implode que explode.

xii.

segue jogo, portanto; segue jogo que o meu avô era soldado e eu já sou alferes; segue jogo que a minha avó era bobinadeira e eu já vendo brincos na parfois. segue jogo porque isto sempre foi assim. segue jogo porque eles não fazem nada e são todos a mesma coisa e só querem é poleiro. segue jogo porque mudamos as caras e eles continuam eles. segue jogo porque o estado está ali e eu estou aqui. segue jogo porque eu jogo esta merda mas não me deixo engrupir nessa jogatana dos partidos. segue jogo porque eu voto mas cago de alto em quem voto. segue jogo porque ainda acredito num pai natal que me vai dar aquilo que eu não sabia que queria. segue jogo porque deixámos a brincadeira definhar de tal maneira que sugerir qualquer outra coisa é como rir num enterro. segue jogo porque as perguntas incomodam e pensar é um desperdício e o tempo está porreiro e há mamas quase à mostra e está ali um tipo a comer-me com os olhos e há sardinhas e uns trocos no bolso para umas mines. segue jogo porque eu esfalfo-me a trabalhar mas o meu filho há-de ser, pelo menos, tão fodilhão como o pai e a minha filha há-de casar com quem a estime e, por isso, têm que ser como os outros e ter o que os outros têm e que nem sabemos se têm mas se aparece na televisão é porque concerteza têm e, raios m’a partam, mas os meus filhos não são menos que ninguém e isto é tudo por eles que eu só quero é que eles tenham o que eu nunca tive que a minha professora primária batia-me na pilinha com uma palmatória e a galdéria do terceiro esquerdo pensa que é alguém só porque o filho mais velho aparece aqui com um hyundai novo e engravatadinho porque é delegado de propaganda médica mas ela há-de ver quando o meu mais novo for estudar para engenheiro. segue jogo porque, concerteza, sempre houve estado, sempre houve portugal, sempre houve nações, sempre houve bola aos domingos, sempre houve escolas e hospitais e cartões de crédito. segue jogo porque estamos todos cansados demais a trabalhar para nos darmos ao luxo de pensar noutro jogo qualquer. segue jogo porque quando, no século passado, se tentou mudar de jogo, aquilo só deu merda. segue jogo porque não vale a pena pensar que este jogo já é diferente e não o vimos mudar. segue jogo porque os outros meninos ainda estão a brincar, mãe, e ainda não me apetece lanchar.

xiii.

se gostamos do jogo, é jogá-lo ‘a sério’. é o futebol total, é jogar no campo todo e pensar em tudo (e em todos) como nosso. é tomar conta dos partidos, nem que seja à bruta; é cuidar do estado como se fosse o nosso alpendre; é jogarmos todos, mesmo o badocha de merda que parece uma menina a chutar a bola. se estamos fartos, é sentar-mo-nos na mesa da cozinha, a embocar o papo-seco, a pensar e a falar que, se calhar, amanhã podíamos brincar antes a...

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Be Polite!


sexta-feira, 20 de maio de 2011

A ALIANÇA OVAL



Foi quando o do meio nasceu. Numa das contracções, ela apertou-me a mão com tanta força que deformou a aliança. De circular passou a oval e passados nove anos, quando a rodo, há uma posição em que me aperta o dedo e outra, a um quarto de volta, em que fica larga.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Negócios do Fim do Mundo (ou talvez não)

O 'DN' já mais parece o 'Correio da Manha', ou uma Sucursal d'O Incrível'...

... ou então é a realidade que é tão manhosa, que já não há maneira de lhe escapar.

Empresários ateus propõem cuidar de animais de cristãos - Globo - DN

terça-feira, 17 de maio de 2011

Simplicidade


segunda-feira, 9 de maio de 2011

Bebe e Olvida



Hey, Cara
Você parece doente
Ou anda com a saúde ausente
Decerto tem a testa quente
O mal será desse dente
Se não passa com aguardente
Vá à caixa e diga que é urgente
Lá há remédio pra toda a gente
Você foi imprevidente
Ou é muito impaciente
Faça cara de contente
Você vai ficar igual
Toma já um melhoral
Porque é bom e não faz mal
Além disso é legal
Toma já um melhoral
É o melhor e é legal
Toma um comprimido
Toma um comprimido
Toma um comprimido que isso passa
Toma um comprimido
Toma um comprimido
Toma um comprimido que isso passa
Eu sei que é nocivo
A isto e áquilo
Esquece isso pelo bem que faça
Eu sei que é nocivo
A isto e áquilo
Esquece isso pelo bem que faça
Você está muito pesada
Não diga que está inchada
Não há roupa que lhe sirva
Não há cinta que lhe valha
Já perdeu de todo a linha
Está a tempo de voltar a fina
É um milagre da medicina
Que é o avanço da aspirina
Tome e fique confiante
Vai ficar muito elegante
Isto é melhor que um purgante
Você vai emagrecer
Cuidado, não abusar
Mas se isso acontecer
Tome outro pra engordar
Cuidado não abusar
Não pare de controlar
Toma um comprimido
Toma um comprimido
Toma um comprimido que isso passa
Toma um comprimido
Toma um comprimido
Toma um comprimido que isso passa
Eu sei que é nocivo
A isto e áquilo
Esquece isso pelo bem que faça
Eu sei que é nocivoA isto e áquilo
Esquece isso pelo bem que faça
Tu estás tão acorrentado
À sombra que tens ao lado
Não consegues apagar
As marcas desse passado
Que teimas em recusar
Mas a mistura da drogaria
E tens a cura para mais um dia
Descola a raiz do fundo
Ficas acima de tudo
Não sentes nada do mundo
Do mundo que te não quer
Cuidado, não abusar
Mas se isso acontecer
És mais um a flipar
Mas se tu queres acabar
Ó que tu queres é drunfar
Toma um comprimido
Toma um comprimido
Toma um comprimido que isso passa
Toma um comprimido
Toma um comprimido
Toma um comprimido que isso passa
Eu sei que é nocivo
A isto e áquilo
Esquece isso pelo bem que faça
Eu sei que é nocivo
A isto e áquilo
Esquece isso pelo bem que faça
Toma um comprimido
Toma um comprimido
Toma um comprimido que isso passa
Toma um comprimido
Toma um comprimido
Toma um comprimido que isso passa
Eu sei que é nocivo
A isto e áquilo
Esquece isso pelo bem que faça
Eu sei que é nocivoA isto e áquilo
Esquece isso pelo bem que faça
Insiste
Toma um comprimido
Toma um comprimido
Toma um comprimido que isso passa
Toma um comprimido
Toma um comprimido
Toma um comprimido que isso passa
ó yé

A minha pilinha é maior que a tua. Ou será o contrário?

Toooooooomaaaaaaaaaa!




E embruuuuuuuuuulhaaaaaaaaaaaaaaa!

Um Homem a Sério


quarta-feira, 4 de maio de 2011

Aerodinâmica